O PODER DO MONGE, SUPERIOR AO DO IMPERADOR

- E que proveito eu tiro da opinião e dos elogios das pessoas?

- A glória, pois, não é outra coisa senão isto.

- Não necessito - me contestas - de semelhante glória, pois busco poder e honra.

- Pois os que o elogiarem, forçosamente também o honrarão. Mas, afinal, já que queres poder e privilégios, também isto, não menos do que tudo o que foi dito, acharemos em maior grau entre os monges. Isto poderíamos fazer-te patente pela via dos exemplos; mas voltando ao procedimento que mais te consola, vamos examinar a questão somente sobre o teu próprio filho.

- Pois bem, o que dizes ser a prova de máximo poder? Não será o poder vingar-se de quem nos ofende e recompensar a quem nos faz um benefício? Na verdade, tamanho poder não se vê inteiramente, nem mesmo no próprio imperador, pois existem muitos que ofendem o imperador e ele não pode revidar, e muitos que lhe fazem um benefício e que não é fácil para ele recompensa-los. E assim, muitas vezes nas guerras, bem quisera ele vingar-se dos inimigos que lhe ofendem e lhe causam danos infinitos, e não pode; e a seus amigos que nas guerras fizeram grandes feitos, tampouco pode ele glorifica-los como merecem, pois caídos no mesmo campo de batalha, foram de antemão arrebatados de toda a recompensa.

- Pois o que dirás se te demonstrar que este poder, do qual, como nosso raciocínio demonstrou, não gozam nem mesmo os imperadores, o possui teu filho no mais alto grau? E não penses que vou falar dos bens do céu, dos quais não acreditas; não me esqueci até este ponto das minhas promessas. Não. Minha demonstração há de se apoiar no que aqui acontece. Pois bem, se o poder máximo consiste em podermos nos vingar de quem nos ofende, muito melhor seria encontrar um gênero de vida em que ninguém, ainda que quisesse, pudesse nos ofender. E que este poder é superior ao primeiro, veremos patente e manifesto transferindo nosso raciocínio para outro exemplo. Senão me dize-me: O que seria melhor: ter muita destreza na arte da guerra que ninguém nos pudesse ferir sem ficar ele ferido ou possuir um corpo de tal condição que ninguém, fizesse o que fizesse, pudesse feri-lo? Qualquer um vê que este poder é superior ao outro e se aproxima do divino. E não há só este, mas outro ainda mais alto que este. Que poder pode ser este? Saber os remédios com que todas as feridas desaparecem sem deixar rastros. Acertado está pois, que há três graus de poder: Primeiro, podermos nos vingar de quem nos ofende; segundo, superior ao primeiro, curar as próprias feridas (o que não se segue necessariamente do primeiro) e terceiro, não ser vulnerável a nenhum homem vivente (com o que, na verdade, se sai da natureza humana), e vou demonstrar-te que é este o poder que teu filho possui.