AS PAIXÕES DA AVAREZA E VAIDADE, GRANDE OBSTÁCULO PARA A SALVAÇÃO NO MUNDO

6.

Pois bem, como com certeza desde o princípio não cantastes a vossos filhos outra cantilena a não ser esta, não lhes ensinastes outra coisa com isto, senão o que há de ser a causa de todos os seus males, pois infundites neles os dois mais tirânicos amores: o amor ao dinheiro, e o outro, que é mais perverso ainda, da glória vazia e vã. Qualquer um dos dois é por si só o bastante para transtornar tudo; mas quando estão os dois juntos, como duas torrentes que confluem, na alma terna do jovem, arrasam todo o bem, pois arrastam consigo tantos espinhos, tanta areia, tanta erosão, que deixam sua alma estéril e infecunda para qualquer boa obra. Sobre isto podem nos testemunhar os próprios escritores profanos e assim, a uma só dessas paixões, sem aliança da outra, alguém chamou a acrópole ou cidadela, outro a cabeça de todos os males. E se, isoladamente, é acrópole e cabeça, o que será quando se juntar a outra paixão mais grave e poderosa, isto é, a loucura da vaidade, e as duas caiam impetuosas sobre a alma do jovem e se apoderem dela e nela lancem raízes? Quem será então capaz de extirpar essa doença, ainda mais quando os próprios pais, longe de trabalhar para arrancar plantas tão más, dirigem todas as suas obras e palavras para que se consolidem e afirmem? Quem será, pois, tão insensato que não desespere da salvação de um jovem assim educado? Nós estaríamos contentes se a alma que goza de discursos contrários a estes pudesse escapar da maldade; mas quando não se propõe outro prêmio senão o dinheiro nem outros modelos para imitações além de homens execráveis, que esperança pode haver de salvação? Porque os que amam o dinheiro, forçosamente hão de ser invejosos, mal intencionados, juradores e perjuros, temerários, maledicentes, ladrões, desavergonhados, descarados, ingratos; enfim, sínteses de todos os males. O bem aventurado Paulo nos atesta isto quando chama a cobiça de raiz de todos os males da vida (1 Tim 6,10); e antes de Paulo, o próprio Cristo nos havia manifestado isto, ao afirmar que não é possível servir a Deus aquele que se acha dominado por esta paixão (Mt 6,24). Pois bem, se desde o princípio se leva o jovem a esta escravidão, quando poderá ele ser livre, quando levantará a cabeça dentre as ondas, se todos o puxam, todos estão empenhados em afundá-lo e o põem em perigo de se afogar? Seria o bastante que quando ninguém o perturbasse e muitos lhe estendessem a mão, pudesse se levantar e olhar para a clara luz e limpar-se do salobre da maldade; e, se por longo tempo encantado com canções divinas, tiver forças para se defender das enfermidades que o agridem, esta façanha merecerá mil louvores e coroas. O costume é uma coisa terrível; digo, terrível para dominar e cativar uma alma, sobretudo quando esta tem o prazer como aliado da paixão, e a outra a qual aspiramos e a cujo porto temos pressa em chegar, nos traz preparados muitos trabalhos.