A VANGLÓRIA DO POVO: O POBRE QUER PARECER RICO

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Porém passemos a outro tipo de vanglória. Qual é este? O que é comum entre as pessoas e não se limita a um ou outro: Nós nos alegramos ao ser louvados sobre coisas que sabemos não termos mérito nem parte. Assim, o pobre move céus e terra a troco de vestir lindos trajes sem outro fim que o de ser honrado pelos demais, e muitas vezes, podendo servir a si próprio, paga um criado, não porque precise dele, mas para não passar pela desonra de servir-se a si mesmo. Porque, se não, responde: Ele que toda sua vida se serviu com suas próprias mãos, que necessidade tem de que agora outro lhe venha servir? Logo, se aumenta seu dinheiro, compra vasos de prata e uma casa muito bonita. Tudo isso é desnecessário. Se tudo isso fosse necessário, a maior parte do gênero humano teria perecido, quero dizer: Há coisas necessárias sem as quais não se pode viver. Assim, é necessário que a terra dê frutos, e sem os produtos da terra não seria possível viver. Vestir-nos, proteger-nos debaixo de um teto, calçar-nos são coisas necessárias. Todo o resto é supérfluo. Porque se também o outro fosse necessário e não fosse possível ao homem viver sem criado, a maior parte do gênero humano teria perecido, pois a maior parte dos homens não tem quem lhes sirva. Se fosse necessário servir-se de vasilha de prata e sem ela não se pudesse viver, haveria também morrido a maior parte dos homens, pois a maior parte nunca vê nas mãos a prata. Pois bem, se aos que possuem a prata se diz: Qual é a finalidade desse vaso? Qual o motivo para possuí-lo e que utilidade te traz? Esse tal não saberia dizer outra coisa senão a honra que recebe do vulgo.

-Tenho o vaso - diz - para chamar a atenção e para eu não ser desprezado; mas o escondo para não provocar inveja e que me queiram prejudicar.

Pode acontecer insensatez maior que essa? Se o tens para granjear-te honra da parte das pessoas, mostra-o para todo mundo; e se temes a inveja, absolutamente não é bom possuí-lo.