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Tudo isto - repito - basta para um infiel; para um cristão,
além de tudo isto, devemos alegar também exemplos tomados de nossa
religião. Que exemplos? Aqueles primeiros grandes e santos varões
que viveram quando ainda não existiam as letras; os que vieram
depois, quando já havia letras, mas não a experiência dos
discursos; os que seguiram a estes, quando havia letras e experiência
de discursos. Pois bem, os primeiros foram alheios a um e a outro,
pois não só careciam de toda a instrução na arte dos discursos,
como ignoravam as próprias letras. E contudo, mesmo naquilo em que
mais necessária parece a força da eloquência, deixaram para trás
com tanta vantagem os mais eloqüentes oradores que estes parecem
crianças que não chagaram ao uso da razão. Porque se toda a força
da eloquência está em persuadir e sabemos que os filósofos não
conseguiram jamais ganhar de um só tirano e os nossos iletrados e
ignorantes converteram toda a terra, é patente que a estes corresponde
a palma da sabedoria, não aos que tão bem conheciam a arte do bem
falar. De onde se vê bem que a verdadeira instrução e a verdadeira
sabedoria não é outra coisa senão o temor de Deus.
E que ninguém pense que trato de decretar como lei que nossos filhos
sejam ignorantes. Não. Se me asseguram o principal, eu não tenho
inconveniente em que se dê também o outro por acréscimo. Se uma
casa treme em suas bases e ameaçam cair as suas quatro paredes, seria
insensatez e loucura extrema correr aos decoradores, e não aos
pedreiros; mas seria também teimosia inoportuna, estando as paredes
firmes e seguras, não deixar que a decorassem desde que o dono tivesse
vontade.
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