A VIDA E AS PALAVRAS DO MONGE, FONTE DE CONSOLO NA DESGRAÇA

8.

Mas, se te agrada, suponhamos que teu filho não consiga nada por intermédio dos outros, senão por si mesmo, e assim levemos um desgraçado a sua presença e ante a tua, ou melhor, não ante a tua presença, mas ante o imperador em pessoa. E vejamos quem poderá ajudá-lo melhor na sua desgraça. E que seja o primeiro a apresentar-se uma pessoa que tenha sofrido a mais dura calamidade que se pode sofrer neste mundo, por exemplo, um pai que tem um filho único e o perde na flor da idade. Não há juiz ou imperador, nem ninguém neste mundo que possa aliviar em nada a desgraça deste pai, muito menos tu; pois nada lhe podes dar que eqüivalha ao que foi perdido. Mas o levemos a teu filho e em primeiro lugar aquela visão, aquele hábito, aquele modo de vida servirão prontamente para levantar-lhe o ânimo e convencê-lo a não dar importância às coisas humanas; e logo, com as suas palavras, dissipará facilmente a nuvem de tristeza do homem aflito. Se entrar, porém, em tua casa, não fará senão aumentar a sua dor. Ao vê-la livre de desgraças, em abundância de felicidade, com o herdeiro seguro, se acenderá cada vez mais a sua ira; mas do deserto ele voltará mais manso e disposto à resignação. Vendo, efetivamente, como teu filho desprezou tão grande fazenda, tanta glória e esplendor, já não sentirá tão vivamente a morte do seu. Como condoer-se de já não ter um herdeiro para os seus bens, ao ver que outro menosprezou tudo isto? E facilmente escutaremos suas palavras sobre filosofia, pois vão acompanhadas da verdade das obras. Mas se tu te atrevesses a apenas abrir a boca, não farias com isso senão enche-lo de tristeza maior, pois tomarias as desgraças alheias como tema de especulação. Teu filho, ensinando-o pelos fatos, o convencerá facilmente que a morte não se diferencia de um sono. Não irá se entreter em ir enumerando os pais que passaram pela mesma desgraça, mas o fará ver em si mesmo como cada dia se exercita em morrer em seu corpo e se acha sempre preparado para a morte e, fazendo mais acreditável a doutrina sobre a ressurreição, o despedirá aliviado da maior parte do peso de sua dor. Enfim, tanto as palavras do monge quanto a demonstração através dos olhos consolarão melhor este pai aflito, do que todos aqueles que o acompanham e o rodeiam nos seus banquetes.

A este curará deste modo. Pois, levemos, se te agrada, mais um, que depois de uma enfermidade, perdeu os olhos. O que poderás fazer em favor deste pobre cego? O monge, ao contrário, mostrando-lhe que isto não é nenhum mal, pois ele mesmo vive trancado numa minúscula cela e corre em direção a outra luz, em comparação à qual considera trevas a presente, o ensinará a carregar generosamente a sua desgraça. E a quem sofreu um dano serás capaz de convencer que o leve resignadamente? De nenhuma maneira. O que irá acontecer é que irás molestá-lo ainda mais, pois nunca vemos tão claramente nossos males, como quando ressaltam em contraste com os bens alheios. E passo por alto a ajuda da oração, que vale mais que tudo o que disse, e a passo por alto porque estou agora falando contigo.