V.7.

A virtude é um hábito eletivo.

Um hábito é uma disposição pela qual uma potência é determinada a uma operação.

Para ser uma virtude, ademais, este hábito deve ser tal que disponha a potência a uma operação chamada eletiva; operações eletivas são aquelas que se dão segundo a eleição (33).

Chama-se eleição a um ato da vontade precedido por um conselho (34). Não são todos os atos da vontade que são precedidos por conselho. Não nos aconselhamos, por exemplo, sobre os fins das ações; quando nos aconselhamos, sempre pressupomos o fim como algo já predeterminado a que a vontade é naturalmente inclinada, somente havendo conselho e eleição a respeito das ações que irão se ordenar a este determinado fim. Ninguém, por exemplo, se aconselha sobre se quer ser feliz, isto sendo algo naturalmente desejado pela vontade; os conselhos só têm sentido em relação aos meios de como alcançar a felicidade (35).

Ademais, somente existem conselho e eleição a respeito de coisas que estão em nosso poder; ninguém se aconselha a respeito das coisas eternas que não podem ser mudadas, nem sobre as coisas que somente podem acontecer de modo diverso por acidente ou pela sorte e não porque dependam de nós, nem tampouco ninguém se aconselha a respeito do que deve ser feito por outrem e não por si mesmo; todas estas coisas, embora não possam ser objeto de conselho e eleição, podem ser objeto de vontade (36), como por exemplo, quando desejamos que faça sol ou que faça chuva, ou quando desejamos que alguém por quem nada podemos fazer recupere a saúde.

Todas as coisas em que pode haver conselho podem, em princípio, ser objeto de eleição. Chama-se conselho a uma investigação da razão necessária nas ações em que estão envolvidas coisas singulares e contingentes que, por causa de sua variabilidade, são incertas (37).

A palavra conselho foi usada originalmente para designar uma reunião realizada entre muitas pessoas que se sentam juntas para conferenciar entre si, pela necessidade de considerarem nas coisas contingentes muitos aspectos e circunstâncias que só com muita dificuldade poderiam ser consideradas por uma única pessoa, mas que são percebidas com mais clareza por muitas, na medida em que um considera o que o outro não percebeu (38). Desta conferência de muitas pessoas o nome conselho passou à atividade da razão de uma só pessoa que imita, tanto quanto possível, a reunião de muitas. Em algumas eleições pode não haver conselho precedente tal como acabou de ser descrito; são eleições que se referem a ações que já estão prescritas por alguma arte ou ciência, ou ações de pouca importância nas quais a sentença do conselho já é manifesta; nestes casos a razão não procede ao conselho, já ditando a sentença do conselho como evidente, mas o ato não deixa, por causa disso, de ser uma eleição (39).

Disto tudo decorre que a eleição é um ato em que intervém tanto a vontade como a razão; e, se as virtudes são hábitos eletivos, isto significa que até mesmo nos atos do apetite concupiscível ou irascível estarão envolvidas as operações da inteligência e da vontade se tais atos forem realizados por meios das virtudes.

De fato, numa eleição a vontade já quer de antemão o fim último que, na eleição, é sempre tomado como pressuposto; a partir daí o conselho investiga a partir de qual movimento ou ação pode-se alcançar aquele fim; encontrado o qual a vontade primeiro consente e depois impera, a si própria ou às demais potências, que operem (40).

Esta é, portanto, a natureza das operações a que as virtudes determinam as potências.



Referências

(33) In libros Ethicorum Expositio, L. II, l. 7, 322.
(34) Idem, L. III, l. 6, 457. (35) Idem, L. III, l. 5, 446. (36) Idem, L. III, l. 7, 460-465.
(37) Summa Theologiae, Ia IIae, Q. 14 a.l.
(38) Idem, Ia IIae, Q. 14 a.3. (39) Idem, Ia IIae, Q. 14 a.5 ad1.
(40) In libros Ethicorum Expositio, L. III, l. 9, 483.
Summa Theologiae, Ia IIae, Quaestiones 14, 15, 17.