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Queres que te mostre por um outro capítulo a tua pobreza e a
riqueza de teu filho? Pois anda, e tira-lhe a única roupa que tem e
expulsa-o de sua cabana e tira-o de seu refúgio e nem desta maneira
verás que ele se enfadonha ou se põe triste; ainda te agradecerá por
isto, pois não fazes senão dar-lhe maiores impulsos à filosofia.
Ao contrário, se te roubarem dez dracmas, terás pranto e
lamentações para toda a vida. Quem será, pois, o mais rico: o
que sofre por coisas mínimas ou o que despreza tudo o que existe?
Mas não te contentes com isto. Desterra-o de todo o país e verás
que ele rirá do desterro, como se fosse brincadeira de criança. A
ti ao contrário, se só te desterrassem de tua cidade, sofrerias
terrivelmente e não terias nem forças para suportar tamanha
desgraça. Já o monge, como dono que se sente de toda a terra e de
todo o mar, se transferirá com a mesma facilidade e sem lástima de um
lugar para o outro, como tu caminhas por teus próprios campos, ou
melhor dizendo, com mais facilidade que tu por teus caminhos. Pois se
é certo que tu podes andar por teus campos, também é certo que tu
terás que atravessar pelos campos alheios; mas o monge anda por toda a
terra como se fosse sua. Os lagos, os rios e as fontes lhe oferecem
por toda parte abundante bebida; comida, os legumes e as ervas e um
pedaço de pão lhe vêm de muitas partes.
Não quero dizer-te todavia que desdenhe do mundo inteiro, como quem
tem sua pátria no céu. E se chegar a hora de morrer, o monge terá
por mais doce a morte que todas as vossas delícias e pedirá a Deus
que morra antes desta maneira e não como vós em vossa pátria e
leito. De modo que bem se poderia chamar de errante, desterrado e de
peregrino, quem tem uma cidade e habita em uma casa, e não quem de
tudo isto carece. Porque ninguém poderá tira-lo de sua pátria, a
não ser que o tirem da terra inteira (falemos assim por enquanto;
pois, segundo a verdadeira razão, se o tiras deste mundo, então é
quando melhor o pões em sua pátria; mas não toquemos ainda neste
ponto, pois tu não entendes mais do que o que entra pelos olhos) nem
o poderás despi-lo, enquanto estiver vestido com o traje da virtude,
nem o matarás de fome, enquanto souber qual é o verdadeiro alimento.
Os ricos, ao contrário, a todos estes percalços estão expostos;
de sorte que, segundo este raciocínio, não estaria errado quem aos
ricos qualificasse de pobres - e manifestamente pobres -, e de
realmente ricos os monges. Porque quem em toda parte pode achar farta
comida, bebida, casa e descanso e não só não sofre por tudo isto,
mas passa melhor do que vós em toda a vossa opulência, é
evidentemente mais opulento que vós, os ricos, que só em vossas
casas podeis ter abundância de todas estas coisas.
Por isso jamais se queixará o monge de sua pobreza. Porque esta
linhagem de riqueza não só é melhor do que a vossa pela sua
abundância e prazer, como também porque é inesgotável, não pode
jamais transformar-se em pobreza, não está sujeita às incertezas do
porvir, nem cria preocupações, nem está exposta à inveja, mas
anda acompanhada da admiração, louvor e aplauso de todo o mundo.
Tudo isso é realmente o oposto, do que acontece a vós. A vós,
além de não vos louvarem as pessoas, por vossa riqueza, se aborrecem
e fogem de vós e vos invejam e vos armam ciladas . O monge, por ser
rico com a verdadeira riqueza, é objeto de admiração e ninguém o
inveja e nem arma ciladas.
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