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- É que com meu filho - replicas - não se passaria isto, nem ele
se teria deixado levar pela cobiça, mas sim se contentaria em gozar do
que tivesse. Para dizer a verdade, isto que me dizes está muito na
direção contrária da natureza; mas, enfim, que também seja isto.
Eu te concedo pela graça do discurso que teu filho não teria tido
vontade de aumentar a seus bens nem desejaria se prender por aquela
furiosa cobiça. Pois ainda neste pressuposto, eu irei te mostrar que
ele vive agora em maior largueza e prazer. O que é, efetivamente,
maior largueza: andar entre tantas preocupações como traz consigo a
riqueza, estar atado a sua guarda e servidão, viver sempre preocupado
em não perder algo do que se tem ou ver-se livre de todas estas
ataduras? Pode ser que teu filho não tivesse vontade de se lançar
sob novas cargas; mas é muito melhor desprezar as que já se leva.
Porque se és sincero e estás convencido de que o sumo bem é não
necessitar de mais do que aquilo que se tem, segue-se que é maior
felicidade estar alheio até à necessidade daquilo que se tem. Porque
ficou demonstrado que aquele que jamais tinha sede nem sabia o que era o
amor (não há inconveniente em voltar outra vez aos mesmos exemplos)
era mais feliz, muito mais feliz não só do que aqueles que são
atacados de sede contínua e que ardem de insaciável erotismo, mas
também do que aqueles que sofrem por breve tempo o desejo e o
satisfazem, como aquele que é alheio à própria experiência de tais
necessidades.
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